8.9.08

Aprendendo a ver.

Eu sempre pude me gabar da minha visão. Sempre enxerguei mais longe. Fácil. Sempre adorei esse meu 'poder' quase anormal, até porque aqui em casa éramos apenas eu e meu irmão mais velho que nunca precisamos. O resto da família, sempre viram o mundo por trás de uma pequena lupa. Mas em contrapartida eu sempre tive crises horríveis de dor de cabeça e todas as vezes em que elas ficavam um pouco mais frequente, minha mãe marcava consulta no oftalmo para a família inteira, mas isso depois eu descobri que era apenas uma desculpa para me fazer ir junto. Ok, sempre saí do mesmo jeito que entrei, e eles com receitas para aumentar o grau dos óculos.

Começou de forma sutil. Digamos que minha rotina não é das mais relaxantes possíveis, e a noite na faculdade eu comecei reparar que quando eu estava andando eu tinha uma certa dificuldade para focar o rosto das pessoas que vinham na minha direção. Comecei a ver que as vezes eu estava vindo na direção de alguém que eu conhecia e só ia reparar mesmo nisso de perto. Nada de muito importante, afinal de contas eu estava tão cansado que pensava comigo mesmo ser um milagre o fato de ainda enxergar alguma coisa. Como sento na parte da frente da sala, eu também nunca tive problemas pra ler a lousa e no cinema que costumo sentar no fundo a legenda sempre foi tranquilo. Mas o rosto das pessoas a noite era um problema.

Marcada a consulta eu cheguei no horário exato. Tive alguns problemas para estacionar o carro e tive que pedir pra recepcionista se eu poderia ganhar R$1,00 de desconto porque tinha gasto com o 'zona azul'. Chegou a ser engraçada a cena. Eu já havia ido uma vez em um oftalmologista que achou curioso eu precisar de 0,25 mas só de vez em quando, porque uma hora eu enxergava e quando ele trocava as letras não. Depois de uns 15 minutos ele descobriu que eu tinha dormido só 3 horas. Claro, culpa da minha mãe que marcou a consulta as 8 da manhã em um sábado que eu estava na praia. Voltando. A recepcionista muito simpática me conduziu a sala da médica. Devo confessar que a médica parecia saber exatamente o que estava fazendo. Eu em compensação não tinha muita idéia. Aliás, eu nem ao menos pude ler as últimas linhas. Me senti um perdedor. Como a minha visão prodígio de repente deteriora-se? Eu estava cansado. Tinha acordado não a muito tempo. Será que era isso, de novo? Saí com 0,5 grau em cada olho, para astigmatismo (longe), claro. Fui direto pro shopping.

No meio do caminho obviamente eu briguei com a minha mãe, que de birra simplesmente não abriu mais a boca. Me senti um imbecil. Uma amiga estava junto e foi simplesmente a salvação porque minha mãe nem ao menos consentia com a cabeça para me ajudar a escolher uma armação que ficasse boa. Ou menos pior. Meu Deus, eu pensava, como é difícil escolher uma armação que você provavelmente usará durante todas as noites da tua vida! A doutora me garantira (claro, que não era uma certeza, mas ela estava bem confiante) que o grau não mudará com a idade, mas disse que piora só até as 17 anos mais ou menos. Ok, o meu piorou com 22, será que pode piorar mais que isso? Saberemos com o tempo.

Voltei para o shopping a noite. Mais tranquilo e com a minha amiga apenas. Minha mãe demorou aproximadas 2 semanas pra voltar a falar comigo quase direito. Eu fiz questão de ir em todas as óticas que o shopping me oferecia e experimentar modelos que iam de 300 até 1800 reais. Assustei, afinal de contas era um pedacinho de ferro, mas o poder das marcas é muito mais forte que o do metal. Escolhi um simples. 'Perninhas' de borracha, azul claro, uma 'meia armação' de metal prateado. Ideal. Poucos passos depois de sair da ótica já me perguntava: ideal mesmo? Pronto. Prato cheio para passar uma semana me perguntando o quão bom de fato tinha ficado. Era impossível saber. Não tinha ficado pronto. Tentei me consolar com o fato da médica ter dito: você pode usar só quando sentir necessidade se quiser. Eu disse a mim mesmo nessa hora no shopping: Ok, uso tipo uma vez ao mês.

Uma semana depois ele ficou pronto. Fui correndo buscar e já saí usando, afinal de contas é trabalhoso para eu me acostumar. E foi aí que eu percebi, a diferença que é ver o mundo daquele jeito. Para quem nunca usou óculos na vida, é estranho demais passar a ver o mundo através de um vidro. Parece que falta alguma coisa. Para o meu consolo, assim que saí da ótica eu percebi que estava sim tendo problemas para enchergar, mas que não dava importância para aquilo. As placas pareciam ter mais sentido. Ainda uso boa parte do tempo. É difícil me acostumar. Agora tenho mais um ítem para pensar quando estou empilhando carteira, celular e adjacentes. Uma das minhas amigas que estava comigo quis provar. Ficou abismada ao conseguir ler alguns nomes de lojas e disse que 'o Mundo fica mais claro' daquele jeito. Eu disse: 'Ok, vá ao médico e acostume-se: você irá ver o mundo através de uma janela. '

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