10.11.16

sugar-high

      

       Escrever às sobre o amor vezes cansa. Se amar já dá trabalho, imagina ficar escrevendo sobre isso? Não que ele se esvaia das minhas veias, acho que isso seria impossível. Eu sou um ser apaixonado, o romântico incurável e muitas vezes um verdadeiro pé no saco por conta disso. Mas dessa vez o texto não é sobre o amor.
       
       Todas as terças-feiras eu vou à dermatologista tentando salvar os fios de cabelo que ainda me restam. Pode me julgar, não tem problema, desde que eu não precise virar um judeu pra ficar usando aquele chapéuzinho pra disfarçar uma das coisas que a genética me presenteou. E olha que não foram poucas! Poderia elencar aqui uma porrada de coisas passando até por heterocromia e daltonismo. É mole? Mas não dá pra processar os pais por conta disso, né? Coitados. Bom, na semana seguinte já havia uma bandeja cheia daquelas balas mastigáveis de iogurte que eu não vou fazer propaganda do nome aqui. Os propagandistas da indústria farmacêutica ficaram me olhando meio de canto de olho pensando se aquilo era um consultório de dermatologia ou psiquiatria, porque eu estava quase deitado naquelas poltronas meio futuristas que parece uma concha, coberto de papeis de bala e boca cheia, mastigando mais que uma vaca ruminando o almoço às 3 da tarde. Depois de comer aproximadamente umas 27, eu pedi encarecidamente para a recepcionista esconder a bandeja em qualquer gaveta que fosse inacessível pra mim. Funcionou. 

       Claro que essa terça-feira eu fui de novo, como todas as outras terças-feiras anteriores, mas dessa vez eu fui no caminho pedindo para Deus intervir em favor da minha saúde, rezando para eu chegar lá e as balas já terem sido comidas por outra pessoa ansiosa e desesperada como eu. Deus escuta, eu tenho certeza, mas a Lady Murphy também, aquela safada filha da puta, e ela chegou antes que Ele lá, porque a primeira coisa que eu vi foi a bandeja, linda, imitando prata, cheia daquelas balas de uma cor que eu, obviamente, não sei identificar, bem no meio da mesinha de frente para as poltronas concha que eu sempre sento bem bonito e quando a dermatologista me chama eu já estou semi deitado, quase me aninhando pra dormir. Ah, mas dessa vez eu nem me fiz de rogado não, como parecia estar se aproximando o fim das balas, o consultório cheio (de novo), eu sentei e já fui colocando a bandeja no colo. Imagina se alguém decide dividir aquelas 32 balas que sobraram? Eu sou taurino e não sei se é influência do signo, mas me dê 3 tapas na cara MAS NÃO ME ENCOSTA NA MINHA COMIDA! Ainda mais se for essas balas mastigáveis de infância, viciantes. Enfim, fui eu lá atacando a bandeja, só fazendo o barulho do plástico abrindo e eu enfiando 3 de cada vez na boca, até que o inevitável aconteceu: uma grudou.

       Eu acho que deveria haver um estudo para analisar a influência da obturação feita com bala mastigável na odontologia moderna, porque aquilo gruda de um jeito que você pensa: ok, fodeu, meu dente vai ficar embalado pro resto da vida. Aí o que você faz? O óbvio: come outra na esperança de que a nova vai descolar a anterior. Olha, ouso dizer que às vezes funciona, mas quando não dá certo, meu Deus do céu! Você vai encapando os dentes como se fosse uma dentadura de plástico e aquilo vai te incomodando até que você se dá conta e já está com 3 dedos dentro da boca tentando desesperadamente tirar aquilo de alguma forma, quase pedindo uma tampa de BIC emprestada. Aí eu lembrei que eu ainda estava na recepção de uma clínica de dermatologia, na frente de várias pessoas que me olhavam incrédulas. Dei aquele sorriso amarelo (no caso meio rosa por causa da camada de bala que eu tinha em praticamente todos os dentes), e fui todo cabisbaixo com a bandeja entregar pra secretária, igual na semana anterior, falando: por favor, me salve de mim mesmo e esconda isso. Ela muito educada escondeu. Eu sentei. A médica atrasou. O que eu fiz? Levantei e falei: Tá, chega, me dá esse negócio aqui, eu prometo que trago um pacote semana que vem. E devorei aquelas últimas balas como se fossem a vacina pro câncer. Se antes eu estava sentado na poltrona com a bandeja no colo, agora eu já estava praticamente de conchinha com a bandeja falando eu te amo de maneira sincera.

       No final das contas a dermatologista me chamou, ainda faltavam três balas, era inadmissível. Pedi pra ela esperar um pouco enquanto ela tentava entender o que eu estava fazendo praticamente abraçado com a bandeja de balas, enfiando as 3 na boca correndo antes de colocar tudo no lugar e jogar meio quilo de papel de bala no lixo. E funcionou! Aquelas três últimas descolaram todas as anteriores e eu pude sentir meus dentes novamente. Também pude escutar alguém falando: gente, imagina o nível glicêmico desse garoto? Deve estar nas alturas! A dermatologista fechou a porta e eu só falei: semana que vem vão voltar aquelas balas de canela do tipo que a gente compra quando não quer dividir né? Ela riu.

c.e.

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