24.9.15

eu, eu mesmo e o ciúmes (parte II)



A primeira coisa que eu pensei foi: porque eu procuro? Porque essa mania de ficar vasculhando o passado das pessoas, que ficou pra trás? As pessoas mudam, se renovam, trocam de amores e de estilo, seja de roupa ou de vida.

Eu fico me prendendo dentro de paredes que eu vou levantando à minha própria volta. E depois fico ali, preso, pedindo socorro pra quem nem sabe como eu fui parar ali. Nem eu mesmo sei, só me dou conta muito tempo depois.

Crio e recrio situações dentro da minha própria cabeça, fantasio sobre coisas que eu acredito que possam talvez ter acontecido. Oi? Exato. Sou desses. Tenho essas viagens mirabolantes em que tudo já aconteceu, já foi consumado, já acabou e foi esquecido, e eu ainda estou descobrindo, como eu imagino que esteja, pra depois saber que foi tudo fruto da minha mente perturbada.

Não tem nada de honesto no caráter das pessoas nas minhas análises de travesseiro. Me remexo na cama a ponto de me enrolar nas cobertas como uma múmia do Louvre. Respiro e transpiro um suor agonizante entre perguntas e respostas que eu mesmo invento. Ninguém precisa colaborar, apenas existir. Eu sou o ciúme personificado e egoísmo puro.

E então eu voltei à pergunta: porque eu procuro? Masoquismo mental. Aquela coisa que você sabe que vai te fazer sofrer, mesmo sem ter razão para isso, e que mesmo assim você acelera e vai de frente. Depois que bato de cara, fico ali, tonto e agoniado tentando achar a posição no travesseiro. Coitado do travesseiro, já levou tanta culpa por noites mal dormidas que ele nem imagina. E ai se ele pudesse imaginar as coisas que eu imagino, tenho certeza que até ele ficaria sem dormir também.

22.9.15

Apto 21




        Toquei a campainha de um jeito meio nervoso e tímido ao mesmo tempo. Eram quase 3 da manhã. 
Eu sabia que ele estaria dormindo. Mesmo sabendo que ele tem o costume de dormir tarde, mas acho que estava exagerando. 

Dei dois passos pra trás. "Porque eu não liguei?", foi a primeira coisa que eu pensei. 
Deveria ir embora. Ele vai me odiar mais ainda. Vai bater à porta na minha cara. 
Não sei porque eu tinha que fazer isso. Mas não segurei. Estava passando tão perto do apartamento dele. 
A luz da sacada estava apagada. 

        Acho melhor ir embora. Esquecer essa ideia ridícula de quem tomou tequila demais. Rum demais. Desilusão demais. 
Fui pra me afastar, virei decidido a ir embora e fingir que nunca saí da mesa daquele bar. 
Mas a porta abriu. Alguém destravou. 
E se não for ele? O que eu faço? Resolvi subir. 
Encarar um lance de escada como se fosse o meu caminho da guilhotina. 
Mas estudei o peito. Eu sabia o que estava fazendo. Bom, eu achava que sim né. 
A porta do apartamento já estava entreaberta. Então foi ele mesmo quem abriu. Nem perguntou quem era, vai ver já imaginava. 
        Fazia quase 2 meses. 
Fiquei parado alguns instantes à porta. Tentando escutar algum som. Algum movimento. Alguma indicação de que seria seguro entrar. 
De novo eu tentei estufar o peito, criar coragem, afinal de contas eu já estava ali, não?
Mas nenhum barulho. Nada. 
        Meu corpo tremia como se estivesse com uma febre irracional.
Respirei fundo, coloquei a mão na maçaneta e fechei a porta.
Era loucura! O que eu estava fazendo ali?
Virei as costas antes que ele pudesse ter alguma reação e disparei escada abaixo. 
Fui direto para destravar a porta e sair novamente para a rua quando escutei um “hey”.
“Onde você vai?” - ele perguntou.



        O meu susto deve ter entregue tudo. me virei quase sem tocar os pés no chão. Eu não queria que ele tivesse me visto. Preferia que ficasse na dúvida pro resto da vida.
Mas não tive coragem de olhar pra cima. Meus olhos encheram de lágrimas e eu sabia que não conseguiria segurar se olhasse pra ele. Aquilo não era eu. Aquilo era a pessoa que ele tinha feito eu me tornar e isso não me agradava.
        Olhando para os pés dele, para os mesmos tênis que sempre acompanharam meus passos, eu disse: vou embora. Eu vim deixar o meu amor pra você. ele é seu. Mas eu sou meu. E nunca mais poderei ser teu. A escolha foi tua, mas a decisão agora é minha. Eu vou ali fora, viver e esquecer que um dia esse tênis aí ó, encostou nas pontas dos meus. 
        Destravei a porta e senti o ar gelado daquela noite no meu rosto. As lágrimas secaram na hora e eu podia sentir o caminho que elas tinham percorrido pelo meu rosto.
Fechei a porta sem olhar para trás. Não sei qual a cara que ele fazia na hora. Não consegui olhar. 
Caminhei na calçada olhando as árvores, os carros, tudo o que se movia ou não.
E de repente tive uma vontade incontrolável de rir. E caí na gargalhada. Ri tanto que meu rosto chegou a doer. 
Era como se toda a tristeza, tudo o que sentia, tivesse ficado ali naquele hall. Naquele tênis. Naquela vida que não me pertencia mais. Era um passado e eu estava aliviado por isso. 

        Entrei no meu carro e fui embora. Pisei no acelerador como se o mundo fosse acabar amanhã. Eu me sentia completamente vivo.